Com apenas 12 anos um
menino chamado
Hans Zimmer
ouvia ensimesmado a voz de Edda del Orso. Como seu cálido lamento ia
crescendo com as cordas, enquanto o
travelling da câmera mostrava uma triste Claudia Cardinalle
afastando-se da estação de trem. Era
uma Vez na América e
Ennio Morricone marcaram a vida do jovem alemão, que sem saber
naquele momento, anos depois provocaria o mesmo efeito em outros jovens
e futuros compositores. É o ciclo da vida, que ele tão bem conhece desde
que ganhou seu único Oscar®.
A admiração de Zimmer pelo Maestro italiano é diretamente proporcional
às críticas que tanto um como o outro receberam em suas respectivas
épocas pela inovação de sua proposta. Uma admiração convertida em
amizade, curiosamente desde que Zimmer ofereceu a Andrea Morricone um
estúdio na Media Ventures. Ser amigo de seu ídolo não é nada fácil. Há
poucos afortunados neste mundo, e Zimmer é um deles, ainda que não o
único.
Aproveitando que a diretora Nancy Meyers estava em plena construção de
personagens de sua nova comédia romântica, Zimmer decidiu aportar algo
mais que idéias. O personagem de Jack Black, compositor de música de
cinema que Meyers introduziu na trama tomando como referência Ramin
Djawadi, jovem colaborador de Zimmer, é um dos principais atrativos
desta divertida comédia de fim de ano. Roteiro ágil, rostos conhecidos (Jude
Law, Kate Winslet, Cameron Diaz), boa ambientação… mas sobretudo a
homenagem contínua ao labor do compositor cinematográfico. É aí onde
Zimmer decide expor seu ponto de vista, e onde Meyers opta por desenhar
o personagem tomando como referência um Zimmer pré-Rain
Man. Desconhecido e com ambição de triunfar.
Apaixonado, mas inseguro. Amante de Morricone (escuta
Cinema Paradiso no carro,
eleva A Missão à oitava
potência), e fervoroso defensor desta arte (a cena da vídeolocadora não
tem preço).
A homenagem não se limita aos diálogos. A primeira faixa do CD en
titulada “Maestro”, é toda uma declaração de intenções, outro ao legado
do italiano. A música é primeiro diégetica, para logo converter-se em
incidental. Deixa de ser interpretada por Jack Black em seu teclado
musicando outro filme, para transformar-se no
leitmotiv principal do
score. Um precioso tema para piano, cordas, guitarra, e
vibrantes e frescos crescendos, marca da casa. Atenção à semelhança das
quatro primeiras notas com o famoso tema de amor de Morricone para
Era Uma vez na América. Um
motivo posteriormente desenvolvido, com um corte mais íntimo, em “Iris
and Jasper”. Amor impossível, amor não correspondido. Merecedor de
aplausos o arranjo que passa de oboé em seu arranque à guitarra acústica
ao final.
“Kayak for One” é uma plácida aproximação com a bossa nova de Sérgio
Mendes. Um tema extrovertido e vivaz como a personagem de Cameron Diaz,
onde se nota a mão do brasileiro Heitor Pereira. Encontramos uma nova
proposta temática em “Zero”, música onde as referências ao Williams de
O Terminal ou
Turista Acidental são
evidentes. Também convém deter-se em “Dream Kitchen”, outro divertimento
em consonância com “Kayak for One”. Guitarra, marimba se acoplam aos
preciosistas arranjos orquestrais de Zimmer. Convém destacar também os
ares de “Minor Swing” de “Light my Fire”, as interessantes transições de
“Definitely Unexpected” ou “Busy Guy”, nde destaca o ritmo sincopado e a
presença dos diferentes motivos principais. Chegamos a “If I Wanted I
Call You”, onde de novo faz presença o tema de amor, em uma de suas
versões mais contidas e tristes.
Como também fizera o Maestro Morricone em seus discos, Hans dedica um
tema à diretora, “For Nancy”. Uma variante do tema central, uma bossa
nova light realmente
agradável, onde escutamos interessantes arranjos vocais a cargo da
mulher do compositor, Suzanne e Imohen Heap. Estes terão maior presença
em “Kiss Goodbye”, como complemento a uma emocionante variação do tema
central, e certamente em “Verso e Prosa” e “Meu Passado”, com a bossa
nova sendo mais uma vez protagonista.
Estamos chegando ao clímax do filme, e Zimmer se torna mais
introspectivo e íntimo em faixas como “The Cowch”, “Three Musketeers” ou
“Christmas Surprise” onde somente no fim se adivinha um final positivo.
Já desenvolvido sem pudor em “Gumption” e “Cry”, retomando as diretrizes
de “Maestro”. O sentido do ritmo, os arranjos para guitarra, a correta
inserção da orquestra, o toque pop
rock. É toda uma declaração de bom gosto, mais uma prova do
talento de um compositor claro e diáfano em suas exposições.
Fica consagrada a soução de Zimmer neste tipo de trabalhos. Sempre novo
e sensível, também menos arriscado, mas de vez em quando especialmente
emocionante, como ocorreu há alguns anos com
Espanglês, uma que possui
semelhanças com este O Amor não tira
Férias. Talvez um trabalho mais disperso que o
score para a película de
James L.Brooks, mas ainda assim uma proposta muito acima da medíocre
média deste ano. Ainda que tampouco devamos esquecer outra referência
muito próxima: The Weather Man.
Score que passou quase
desapercebido, e onde o alemão introduz uma série de idéias quanto a
ritmo, timbre e melodia, que certamente seguirá aperfeiçoando nos
próximos anos. Este é o primeiro exemplo. |