Quero iniciar este comentário fazendo uma
declaração sincera: eu realmente gosto do trabalho do Christopher
Young, tendo escutado e apreciado seus scores ao longo dos anos,
iniciando com o marcante Hellraiser, de 1987. Certamente ele é um
dos meus compositores contemporâneos favoritos, porém eu não consigo
reconhecer sua música em uma primeira audição. Na minha opinião, Young
ainda não possui uma voz musical característica como autor, algo que
colegas de sua geração, como
James Newton Howard
e Elliot Goldenthal, já definiram há tempos. Dito isto, eu não penso que
isto seja um grande problema, em vista da alta qualidade de sua
produção. Este O Júri (Runaway Jury), por exemplo, não
apresenta o que poderia ser uma marca registrada de Young. Às vezes ele
soa como um trabalho de Newton Howard, às vezes até como um score
de Thomas Newman. Entretanto, como qualquer partitura de Christopher
Young, ela serve perfeitamente bem ao filme e é apreciável como um álbum
de trilha sonora.
O compositor não é estranho aos gêneros do suspense e dramas de
tribunal, tendo composto sólidos scores para filmes como
Judicial Consent (1994) e Murder In The First (1995). Desta
vez, a música de Young acompanha um filme baseado no livro de John
Grisham, que trata de um processo que atinge os interesses da indústria
de armas de fogo norte-americana. Tanto os advogados de defesa como de
acusação tentam manipular o corpo de jurados, a fim de obter uma
sentença que lhes seja favorável, e no desenrolar do filme terão de
lidar com o poder da poderosa corporação e seus dilemas morais. Sob a
trama, ambientada em Nova Orleans e conduzida por um elenco de primeira
(Dustin Hoffman, Gene Hackman, Rachel Weisz e John Cusack), a música
consegue estabelecer com sucesso o cenário, a atmosfera e a tensão do
filme. Young compôs um motivo principal baseado em piano e cordas, e
dois motivos blues/jazz secundários que representam o cenário
sulista onde transcorre o filme, bem como as atividades relacionadas ao
tribunal. Todos são, às vezes, enriquecidos pelo vocal de Teresa James.
“Runaway Jury” abre o CD e introduz o tema principal do score. Os
violinos e o violão logo se juntam ao piano e à voz de Teresa James. É
uma faixa sombria, melancólica, que termina com o retorno do trio
voz/piano/cordas. Em “Dumb Witness” o vocal está de volta, desta vez
introduzindo um motivo secundário interpretado por piano elétrico,
percussão e um trompete jazzístico. Aqui, posso ouvir ecos do antológico
score de Quincy
Jones para o clássico policial de Sidney Lumet de 1967, No Calor
da Noite (In The Heat of The Night), que também se passava no
sul dos EUA. “Cheaper by the Dozen” começa com instrumentação eletrônica
e ritmo funk; na sua segunda metade, a composição ganha tons de
suspense. Na curta “The Game's Afoot”, a guitarra elétrica é ouvida pela
primeira vez, juntamente com a seção de cordas da orquestra. “Not Lady
Liberty” traz um interessante trabalho de cordas ascendentes, um solo de
trompete e trechos do motivo principal. “Shark Tactics” é uma atraente
faixa de suspense conduzida por orquestra e eletrônicos, que se
transforma em material de ação com afiadas intervenções de cordas e
metais.
“The Divine Komeda” traz de volta o motivo jazzístico, desta vez com
guitarra elétrica e bateria funky. “Jury for Sale” e “Easter's
Con” contém alguma percussão oriental no estilo de Thomas Newman. Em
“Voir Dire” temos orquestra, contudo a composição é baseada em
sintetizadores e percussão eletrônica, alternando momentos de suspense e
ação. “Habeas Corpus” combina o motivo secundário do tribunal com outra
interpretação do tema principal. “Rankin Fitch” inicia de modo
ambiental, com uma lenta introdução de teclado, percussão e eletrônicos.
Permanece ambiental, com os efeitos de sintetizador aumentando perto de
sua conclusão. “Spilt Whiskey” tem seu sabor blues pontuado por
guitarras e teclado. “The Devil's Not Such a Bad Guy After All” é um
exercício de ritmo sem bateria, baseado apenas em piano elétrico e um
pouco de percussão criativa.
“Fayeth in Fate no More” é a faixa mais longa do disco, que traz de
volta alguns elementos e motivos anteriormente ouvidos no score.
Basicamente é uma peça de suspense, com efeitos percussivos e
eletrônicos. “Who Hurt You?” nos apresenta a melhor e mais intimista
versão do tema principal, seguida por “Unconditional Love”, onde a
partitura é concluída com um trabalho de cordas muito bom, onde ouvimos
pela última vez a voz feminina.
Runaway Jury é uma trilha às vezes
sutil, mas na maior parte do tempo poderosa, uma das melhores para este
gênero de filmes (que, de regra, não apresenta trilhas de destaque), com
um bem merecido álbum de 1 hora de duração da Varèse Sarabande. |