|
|
Todo blockbuster de Hollywood tem
histórias pitorescas e até polêmicas de bastidores, que surgem antes da
sua estréia nos cinemas. Com Tróia não foi diferente, tendo
algumas ficado no terreno da futilidade, como aquela de que teriam usado
um "dublê de coxas" para Brad Pitt (que não teria coxas dignas de seu
personagem Aquiles); outras envolveram aspectos importantes da produção,
sendo o caso mais notório a rejeição da trilha sonora original que
Gabriel Yared compôs para o filme. Yared, que como você deve saber,
ganhou um Oscar por seu trabalho em O Paciente Inglês, passou
mais de um ano trabalhando em um elaborado e grandioso score para
Tróia. Contudo, como não é raro de acontecer, algumas semanas
antes da estréia do filme o trabalho do compositor foi rejeitado, uma
vez que os produtores, mesmo reconhecendo a qualidade do trabalho de
Yared, decidiram que ele era muito "antiquado" e que Tróia
deveria ter uma linguagem musical mais afinada com os tempos atuais -
entenda-se, que "tivesse uma trilha sonora da moda" (étnica).
Em face da complicada situação formada - a nova trilha teria de ser
composta, gravada e adicionada ao filme em poucas semanas, o diretor
Wolfgang Petersen teve de recorrer a alguém com a experiência de
trabalhar nestas condições e, acima de tudo, com a capacidade de criar
uma partitura funcional com a sonoridade exigida, algo na linha dos sons
ouvidos em
Gladiador e
A Paixão de
Cristo. Entra em cena nosso conhecido e competentíssimo
James Horner, que já
trabalhara com Petersen em Mar em Fúria. De habilidade e recursos
indiscutíveis, Horner encarou a missão suicida e compôs 120 minutos de
música em 13 dias, levando outros 12 para gravá-la com uma grande
orquestra de 118 instrumentos (entre eles, 5 pianos), regida por ele
mesmo, e coral. O resultado pode ser conferido no filme e nos 75 minutos
de música contidos no CD lançado pela Warner. Horner, como seria de
esperar, entregou uma trilha sonora funcional e que contém os elementos
que lhe foram exigidos - instrumentação e vocais étnicos, com uma
solista à la Lisa Gerrard, e orquestração contemporânea. De um modo
geral, novamente ele comprovou sua grande versatilidade e experiência
como compositor de cinema, orquestrador e maestro.
Porque, digam o que disserem, poucos profissionais do ramo, hoje, teriam
condições de concluir uma trilha original de qualidade mínima no curto
prazo que ele teve. E, neste aspecto, o score de Horner para
Tróia, principalmente como ouvido no filme, pode ser considerado um
trabalho bem sucedido. Já em disco, ficam mais expostos os conhecidos "hornerismos",
que tem origem na insistência do compositor em reaproveitar porções de
seus trabalhos anteriores (e, não raro, de outros compositores). Neste
aspecto, o que mais é visível (melhor dizendo, audível), é aquele
motivo de quatro notas que Horner tomou emprestado de Prokofief,
celebrizado em
Jornada nas
Estrelas II: A Ira de Khan como o tema do vilão. Ao longo dos
anos o compositor vem repetindo este tema para representar o perigo, com
pouquíssimas variações, em uma série de filmes de temáticas distintas,
como Willow,
A Máscara do Zorro e
Círculo de Fogo. Em
Tróia ele é utilizado para
representar o exército grego e, forçoso é reconhecer, mais uma vez de
forma eficaz. No álbum este motivo é ouvido primeiramente em "Achilles
Leads The Myrmidons", e posteriormente em trechos de música de batalha.
Além desta trademark, a partitura é recheada das orquestrações de
cordas e percussão típicas do compositor para trilhas de ação e
suspense, porém sem a mesma coesão e foco de trabalhos mais antigos -
reflexo, provavelmente, da falta de tempo para lapidar melhor estas
composições.
"The Greek Army and It's Defeat" é, no caso, uma boa exceção. Na sua
introdução, Horner usa os registros graves dos cinco pianos para criar
um ritmo militar e estável, como se a música fosse um exército em
marcha. Ela inicia lentamente com as notas dos pianos, com os metais e
samplers
vindo em seguida repetindo o motivo grego, mas logo a música acelera-se
e Horner adiciona percussão à mixagem. A faixa conclui com o tema
heróico ascendente/descendente dos troianos, interpretado em metais
(cuja primeira aparição se dá em "Troy"). "Briseis and Achilles"
introduz no álbum o tema de amor do filme, que não é dos mais inspirados
de Horner. O que é de se lamentar, já que o compositor, em sua carreira,
compôs alguns love
themes belíssimos. Para completar, este tema guarda uma grande
semelhança com o tema de Stargate, de
David Arnold... Se
de um modo geral os temas que Horner criou para Tróia não chegam
a empolgar, dentre eles destaca-se o tema composto para o guerreiro
Aquiles. Nele, a música consegue transmitir muito bem o heroísmo do
personagem, especialmente em "Achilles Leads The Myrmidons", faixa de
ação com uma ótima escrita para cordas e metais. O tema de Aquiles
retorna em outros momentos, como em "The Trojans Attack" e "Through The
Fires, Achilles... And Immortality", valorizando tais composições.
Outro momento atrativo da trilha chega em "Hector's Death", que
acompanha o confronto de Heitor com Aquiles. A faixa inicia e transcorre
por um bom tempo somente com percussão, até que o coral étnico assinala
a queda do guerreiro troiano. Em seu conjunto a composição possui um tom
tribal bem interessante. Além da grande orquestra e coral, como já citei
ao início temos os vocais femininos da solista Tanja Tzarovska, que
também participou do
score
rejeitado de Yared. Sua voz é ouvida já na faixa inicial, "3200 Years
Ago", e retorna em vários momentos do
score, como "The Temple of Poseidon". Sem surpresa, os solos de
Tzarovska lembram muito os de Lisa Gerrard em
Gladiador, e
têm grande relevo na música. De fato, tanto relevo que um
scoretracker
comentou ter se irritado com a intérprete, que parecia sofrer de
cólicas menstruais violentas... E sim, não nos esqueçamos da obrigatória
canção ao final, uma versão vocal do tema de amor interpretada por
Tzarovska e Josh Groban, que certamente foi incluída para concorrer ao
Oscar - sorry
James, mas eu duvido muito disso.
Bom, no frigir dos ovos é isso -
Tróia é mais
um eficiente score
de Horner, que poderia ser melhor se o compositor tivesse um
pouco mais de tempo para entregar um trabalho mais elaborado e,
preferencialmente, sem a sua "marca registrada" de quatro notas. Ah, e
quanto à inevitável pergunta: afinal, o score de Horner é melhor
que o de Yared? A resposta vocês podem conferir aqui mesmo no
ScoreTrack.net, no comentário do
CD Promo
contendo a partitura rejeitada. Gabriel Yared chegou, inclusive, a
disponibilizar por algum tempo em seu
site oficial, na seção "News",
The score for Troy,
clipes deste trabalho. |
CDs COMENTADOS |
|